- CONTINENTE: América
- REGIÃO: América do Sul
- PAÍS: Brasil
- CAPITAL: Brasília
- IDIOMA: Português
- GOVERNO: República federativa presidencialista sob uma ditadura militar bipartidária
- PRESIDENTE:
- 1964 Ranieri Mazzilli
- 1964–1967 Humberto de Alencar Castelo Branco
- 1967–1969 Artur da Costa e Silva
- 1969–1974 Emílio Garrastazu Médici
- 1974–1979 Ernesto Geisel
- 1979–1985 João Figueiredo
- PERÍODO: Durante A Guerra Fria & Pós-modernismo
- 1 de abril de 1964 Golpe de 1964
- 1985 Diretas Já
- MOEDA: cruzeiro (1970–1986); cruzeiro novo (1967–1970); cruzeiro (1942–1967)
Com as desavenças que grassavam na corrente outubrista, o tenentismo vem a se desintegrar. Tal fato se dá após a Revolução de 1932, mormente durante o ano de 1933, quando se formava a Assembleia Nacional Constituinte. Parcelas das Forças Armadas se desgarraram para a esquerda e para a direita, incorporando-se à Aliança Nacional Libertadora e à Ação Integralista Brasileira, que apregoavam ideologias importadas, não condizentes com a idiossincrasia de nosso povo.— Manuel Soriano Neto
Portanto, dentro das forças armadas brasileiras, existia uma grave cisão interna de ordem ideológica e, ainda havia outra divisão entre os moderados e a linha dura. Os grupos concorrentes entre si defendiam pontos de vistas diferentes: um grupo defendia medidas rápidas diretas e concretas contra os chamados subversivos, ou inimigos internos, estes militares apoiavam sua permanência no poder pelo maior tempo possível; ao contrário do grupo anterior, o segundo era formado por militares que tinham por doutrina a tradição de intervenções moderadoras. Estes procuravam permanecer no poder somente o tempo necessário até se formar um governo aceito pelo grupo a exemplo de 1930, 1945 e 1954. Quando passado o período de maior risco institucional houve o rápido retorno do poder para os civis. Para os dois grupos era necessário salvaguardar o Brasil contra o poder do comunismo internacional (além do antigetulismo, leia-se populismo).
Segundo a doutrina dos militares, o inimigo devia ser extirpado a todo custo e os governos populistas seriam uma porta de entrada para a desordem, subversão e propiciariam a entrada de ideologias nocivas à nação. As facções contrárias internamente nas forças armadas acabaram se unindo apesar da não concordância metodológica. Desta forma, os militares mais radicais se aglutinaram ao general Costa e Silva, e os mais estratégicos ao marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. Muitos militares da época afirmam que se a orientação filosófico-ideológica das forças armadas fosse para a esquerda, estas defenderiam da mesma forma a linha de pensamento, somente o inimigo que mudaria de lado, o que importava era a segurança da Nação.
Atualmente é sabido que as contradições de pensamentos e ações dentro das Forças Armadas (a dita cisão interna) causou a expulsão e a prisão de muitos militares no momento seguinte ao golpe. Exemplo disso foi quando o general Kruel garantiu que o Exército Brasileiro jamais iria contra a Constituição Brasileira de 1946, e que defenderia os poderes constituídos, e quando o general Olympio Mourão Filho declarou que João Goulart, devido ao abuso do poder e de acordo com a Lei, fora deposto.
FALSA AMEAÇA COMUNISTA
O principal argumento para a instauração de uma ditadura militar no país foi a iminência de uma ameaça comunista no país em 1964. No entanto, segundo o historiador Rodrigo Patto Sá Motta, doutor em História pela USP e professor do Departamento de História da UFMG, o Brasil nunca esteve perto do comunismo, nem mesmo em 1964, ano de início da ditadura militar no Brasil. Numa entrevista, afirmou:
Se o regime político instaurado em 1964 era popular e tinha apoio majoritário da população, por que diabos necessitou de mecanismos autoritários para se manter no poder?". E completa: “Consideremos por um momento, apenas para construir raciocínio hipotético, que havia séria ameaça comunista e a intervenção militar visava defender a democracia contra o totalitarismo (reitero que considero tais argumentos sem fundamento). Se assim fosse, qual a justificativa, então, para terem instalado uma ditadura e se aboletarem no poder durante duas décadas? Porque não entregaram o poder aos civis depois de derrotada a “ameaça"?
— Rodrigo Patto Sá Motta, 1964: “O Brasil não estava à beira do comunismo”
O historiador diz ainda que a ideia de dizer que houve tais ameaças seria para intensificar uma campanha de grupos de direita em defesa daquele período e de dar legitimidade a um governo comandado por militares. Em outro trecho, afirma:
…a grande imprensa e outras instituições fizeram forte barragem discursiva em favor da queda de Goulart, em que mobilizaram à exaustão o tema do perigo vermelho (comunistas) para incrementar o clima de pânico. O certo é que ao sair dos quartéis as Forças Armadas desequilibraram a situação e promoveram a derrubada de Goulart, por isso seu papel foi essencial no golpe.
— Rodrigo Patto Sá Motta, 1964: “O Brasil não estava à beira do comunismo”
Uma reportagem do jornal The Intercept afirma que as supostas guerrilhas de Jango, o armamento em posse das Ligas Camponesas (considerado o MST da época) e as infiltrações comunistas nas forças armadas não passavam de fantasia, e que o golpe de 64 ocorreu sem resistência, pois "resistência não havia". Além disso, as lutas armadas comunistas só apareceram após a implementação da ditadura, e não antes dela, e na verdade nunca colocaram em risco a democracia brasileira.
CONEXÕES CIVIS DO REGIME
A partir da década de 2000, vários historiadores passaram a defender a ideia de que o golpe, assim como a ditadura que se seguiu, não foi exclusivamente militar, sendo, em realidade, civil-militar. Pelo menos no início, houve apoio ao golpe por parte de segmentosi mportantes da sociedade: os grandes proprietários rurais, uma grande parte da classe média urbana (que na época girava em torno de 35% da população total do país) e o setor conservador e anticomunista da Igreja Católica (na época majoritário dentro da Igreja) que promoveu a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 19 de abril de 1964.
No entanto, a população brasileira, à época, ainda majoritariamente rural e em grande parte analfabeta — e, na época, sem direito a voto[39] — manteve-se quase sempre inerte e distanciada da política nacional. No campo, a exceção eram as "ligas camponesas", lideradas pelo advogado Francisco Julião, que lutavam pela reforma agrária. Entre as figuras históricas civis afinadas com o movimento militar, estão os governadores Magalhães Pinto (Minas Gerais), Adhemar de Barros (São Paulo) e Carlos Lacerda (Guanabara, atual Estado do Rio de Janeiro).
O apoio clerical, no entanto, não era completo. A partir de outubro de 1964, especialmente quando ativistas católicos de esquerda foram presos, certos setores da chamada "ala progressista da Igreja Católica" da Teologia da Libertação, passaram a denunciar a violência do governo militar.
Grande parte da imprensa, os chamados "Diários Associados", que eram compostos por revistas, rádios, jornais e emissoras de TV, como O Globo, Folha de S.Paulo, Correio da Manhã, Jornal do Brasil e O Estado de S. Paulo festejaram a deposição do governo de Goulart. Contrariando essa tendência, apenas o jornal Última Hora combateu o golpe, o que levou o seu diretor Samuel Wainer a exilar-se. Em 1 de abril de 1964, o jornal O Estado de São Paulo trazia o seguinte texto: "Minas desta vez está conosco (…) dentro de poucas horas, essas forças não serão mais do que uma parcela mínima da incontável legião de brasileiros que anseiam por demonstrar definitivamente ao caudilho que a nação jamais se vergará às suas imposições." No Jornal do Brasil se lia: "Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade … Legalidade que o caudilho não quis preservar, violando-a no que de mais fundamental ela tem: a disciplina e a hierarquia militares. A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas".
A edição do jornal O Globo de 2 de abril de 1964 dizia: "Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares que os protegeram de seus inimigos". E O Estado de Minas trazia em 2 de abril: "O ponto culminante das comemorações que ontem fizeram em Belo Horizonte, pela vitória do movimento pela paz e pela democracia foi, sem dúvida, a concentração popular defronte ao Palácio da Liberdade". A edição de 4 de abril trazia: "Ressurge a Democracia! Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente das vinculações políticas simpáticas ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é de essencial: a democracia, a lei e a ordem". Segundo a Fundação Getúlio Vargas, "(…) o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja católica, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica".
CRONOLOGIA
Golpe militar e influência estrangeira: Na madrugada de 31 de março de 1964 o general Olympio Mourão Filho iniciou a Operação Popeye, mobilizando tropas de Juiz de Fora rumo ao Rio de Janeiro com o objetivo de depor o governo constitucional de João Goulart. O presidente encontrava-se no Rio de Janeiro quando recebeu um manifesto exigindo sua renúncia. O chefe da Casa Militar e organizador do “dispositivo militar” governista, general Argemiro de Assis Brasil, não conseguiu colocar em prática um plano que teria a função de impedir um possível golpe. Os partidos de sustentação do governo ficaram aguardando a evolução dos acontecimentos. O presidente, de Brasília, seguiu para Porto Alegre e se refugiou numa estância de sua propriedade, e depois rumou para o Uruguai, no dia 4 de abril de 1964. Porém, o presidente do Senado Federal declarou vaga a presidência e a vice-presidência da república no dia 2 de abril de 1964, com Goulart em território nacional, e empossou o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, na presidência da república. No dia 2 de abril ocorre a Marcha da Vitória, na cidade do Rio de Janeiro, garantindo apoio popular à deposição do presidente João Goulart.
Blindados, viaturas e carros de combate ocuparam as ruas das principais cidades brasileiras. Sedes de partidos políticos, associações, sindicatos e movimentos que apoiavam reformas do governo foram destruídas e tomadas por soldados fortemente armados. À época, estudantes, artistas, intelectuais, operários se organizavam para defender as reformas de base. A sede da União Nacional dos Estudantes (UNE) foi incendiada.
Segundo a Fundação Getúlio Vargas, "o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Adhemar de Barros, de São Paulo), além de setores da classe média, pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica".
Os Estados Unidos, que já vinham patrocinando organizações e movimentos contrários ao presidente e à esquerda no Brasil durante o governo de João Goulart, participaram da tomada de poder, principalmente através de seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e haviam decidido dar apoio armado e logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma resistência armada por parte de forças leais a Jango: em Washington, o vice-diretor de operações navais, John Chew, ordenou o deslocamento para a costa brasileira (entre Santos e Rio de Janeiro) de uma força-tarefa da Marinha Americana (incluindo o porta-aviões Forrestal, seis contratorpedeiros, um porta-helicóptero e quatro petroleiros), operação que ficou conhecida como "Brother Sam".
Após a deposição de João Goulart, vieram os Atos Institucionais (AI), mecanismos jurídicos autoritários criados para dar legitimidade a ações políticas contrárias à Constituição Brasileira de 1946 que consolidaram o regime militar implantado.
O presidente João Goulart permaneceu em território brasileiro até o dia 2 de abril. Nesse dia, em um golpe parlamentar, o Congresso Nacional, pela voz do senador Auro de Moura Andrade, declarou que a Presidência da República estava vaga e deu posse ao Presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, que permaneceu no cargo até 15 de abril de 1964, embora representasse um papel meramente decorativo: o governo era exercido pelos ministros militares.
Em uma inversão constitucional — os militares passando de defensores da Constituição a subversivos dela e causadores de uma crise política — acabou predominando a força das armas e o Presidente da República foi deposto. Goulart partiu para o exílio no Uruguai, morrendo na Argentina, em 1976.
GOVERNO CASTELO BRANCO (1964-1967)
Entre os membros do MDB, incluíam comunistas do PCB abrigados no MDB que não aceitavam a luta armada como alternativa de oposição ao regime militar e se intitulavam "Resistência Democrática". Sob justificativa do crescimento dos movimentos de esquerda e pela influência da propaganda pelos movimentos chamados de subversivos (veja o artigo: A esquerda armada no Brasil), observando ainda que a população brasileira mais humilde iniciava um movimento em direção à esquerda, a elite brasileira e a classe média começaram a temer o rápido avanço do chamado, pelos anticomunistas de "perigo vermelho" ou "perigo comunista". Segundo relatos publicados pelo Departamento de Documentação Histórica da Fundação Getúlio Vargas: "Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas e deter a "ameaça comunista" que, segundo eles, pairava sobre o Brasil."
Em 17 de julho, sob a justificativa de que a reforma política e econômica planejada pelo governo militar poderia não ser concluída até 31 de janeiro de 1966, quando terminaria o mandato presidencial inaugurado em 1961, o Congresso aprovou a prorrogação do seu mandato até 15 de março de 1967, adiando as eleições presidenciais para 3 de outubro de 1966. Esta mudança fez com que alguns políticos que apoiaram o movimento passassem a criticar o governo, a exemplo de Carlos Lacerda, que teve sua pré-candidatura homologada pela União Democrática Nacional (UDN) ainda em 8 de novembro de 1964. Na esteira dos Atos Institucionais, foram expedidos Atos Complementares.
Nas eleições, realizadas em outubro de 1965, o governo venceu na maioria dos estados mas foi derrotado nos dois mais importantes, Guanabara e Minas Gerais, onde foram eleitos, respectivamente, Francisco Negrão de Lima e Israel Pinheiro, apoiados pela coligação PSD/PTB. Em consequência disto, o presidente Castelo Branco editou, em 27 de outubro de 1965, o Ato Institucional nº 2, AI-2, que, entre outras medidas, extinguia os partidos políticos, estabelecia eleições indiretas para a presidência da República, facilitava a intervenção federal nos estados e autorizava o presidente da República a cassar mandatos parlamentares e suspender os direitos políticos. O que era um movimento militar passou a se constituir num regime, evoluindo para uma linha dura no comando do marechal Artur da Costa e Silva (1967-1969).
No âmbito social e econômico, algumas instituições, leis e projetos desse governo, ainda em ativa hoje, são: Estatuto da Terra (1964), Banco Central do Brasil (1964), Código Eleitoral Brasileiro (1965), Código Tributário Nacional (1966), Banco da Amazônia (1966), FGTS (1966), SUDAM (1966), Código de Mineração (1967)e Zona Franca de Manaus (1967).
GOVERNO COSTA E SILVA - INÍCIO DOS ANOS DE CHUMBO (1967-1969)
Ex-ministro da Guerra, o marechal Costa e Silva teve o seu nome indicado pelas Forças Armadas e referendado pelo Congresso Nacional. No dia 15 de março de 1967, o marechal Artur Costa e Silva é empossado no cargo de Presidente da República, tendo Pedro Aleixo como Vice-presidente. Com sua posse começa a vigorar a Constituição de 1967. O Presidente deixa o cargo no dia 31 de agosto de 1969. Com predominância de ministros militares e civis — o paulista Antônio Delfim Netto era o ministro da Fazenda — o presidente empossado organizou o seu ministério. As taxas de inflação caíram nos primeiros anos de governo reaquecendo a economia e aumentando a presença de investimento estrangeiro no país.
No campo político, porém, não havia sinal de retorno à democracia plena. Os militares defendiam um endurecimento maior do regime, a chamada "linha dura". Vieram as perseguições políticas, em missões organizadas pelos órgãos de segurança do governo. Uma onda de protestos surgiu em todo o país, com enfrentamento direto entre as forças de segurança contra os manifestantes pró-comunismo, militantes de esquerda e estudantes cooptado por organizações subversivas, crescendo para grandes manifestações reivindicatórias e de contestação ao regime e a intolerância e as desavenças eram comuns, as patrulhas ideológicas organizadas pelos comunistas agiam nas escolas, clubes e sindicatos.
Reações e protestos: As manifestações e protestos ganham as ruas em quase todas as principais cidades do Brasil nos primeiros anos após o golpe militar. Os estudantes começam também a radicalizar suas ações. Com a chegada do general Artur da Costa e Silva ao poder, as greves dos operários tomaram corpo, na mesma proporção em que a linha dura já fazia suas vítimas.
Em 28 de março de 1968, quando da preparação de uma passeata de protesto que se realizaria em função do mau funcionamento do restaurante do Calabouço, no Rio de Janeiro, cujas obras ainda não haviam terminado, havendo ratos, baratas e falta de higiene, para o fornecimento de alimentação aos adolescentes estudantes do científico (segundo grau), o estabelecimento foi invadido pela Polícia Militar.
Segundo oficialmente noticiado, a causa da invasão daquele estabelecimento pela Polícia Militar era a reunião de comunistas que estariam armando um golpe violento para desestabilizar o regime. A invasão resultou na repressão violenta de seiscentos alunos e na morte do estudante Edson Luís de Lima Souto, assassinado com um tiro no coração, com uma pistola calibre 0.45, pelo tenente Alcindo Costa, que comandava o Batalhão Motorizado da PM.
Quando o restaurante estudantil Calabouço foi invadido pela Polícia Militar, e Edson, de 18 anos de idade, assassinado, a violência policial continuou. Outros estudantes, curiosos e transeuntes foram feridos por estilhaços de granadas, intoxicados por bombas de gás lacrimogêneo, gás fumígeno, atingidos por balas de fuzis e metralhadoras disparadas a esmo.
Os confrontos entre a polícia e estudantes recrudesceram: os policiais utilizavam fuzis 0.30, metralhadoras automáticas INA 0.45, escopetas calibre 12, pistolas de grosso calibre Colt 45, granadas estilhaçantes reais, granadas de gás lacrimogêneo, granadas de efeito moral, cavalaria hipo e autopropulsada com metralhadoras ponto cinquenta; os estudantes usavam como armas paus, pedras, bombas caseiras, feitas com álcool e óleo de cozinha, e bolinhas de gude para derrubar as montarias.
Segundo a imprensa (apesar da censura ferrenha) e registros nos hospitais locais, os feridos foram 200 civis, a maioria por espancamento, cento e três gravemente feridos, 85 por tiros de armas de fogo e estilhaços de artefatos explosivos, e quatro militares com ferimentos leves. O tenente autor do tiro foi preso e, após responder inquérito, foi liberado impune.
Em 29 de março de 1968, houve um protesto de 50 mil pessoas no centro do Rio de Janeiro. Em junho, uma multidão calculada em 100 mil pessoas realizou durante mais de sete horas uma passeata de mães, padres, estudantes, artistas e intelectuais pela liberdade dos presos, episódio que se tornou conhecido como Passeata dos Cem Mil. Foram 100 mil cidadãos, membros do movimento estudantil, setores da Igreja Católica e grupos de senhoras a protestar, que anteriormente haviam incentivado a Marcha da Família com Deus pela Liberdade e a Marcha da Vitória, promoveram em passeata a segunda maior mobilização do período contra o regime ditatorial até então, perdendo somente para o comício da Praça da Sé, em São Paulo.
Segundo a imprensa, o movimento não registrou qualquer distúrbio. Começou com uma concentração na Cinelândia, às dez horas e trinta minutos, seguiu pelo Largo da Candelária às 15 horas onde se deteve por 45 minutos para um comício, em seguida, rumou pela rua Uruguaiana até à estátua de Tiradentes, na Praça XV de Novembro, onde encerrou às 17 horas. Agentes do DOPS e do SNI acompanharam todo o movimento, filmando e fotografando a maior quantidade possível de manifestantes, principalmente os líderes. O DOPS prendeu cinco estudantes que distribuíam panfletos, um policial que incitava o apedrejamento do prédio do Conselho de Segurança Nacional também foi preso e solto logo em seguida, ao ser constatada a sua função.
AI-5
Primeira página do AI-5. Documento sob a guarda do Arquivo Nacional.
No governo estavam oficiais da linha dura, e as ruas eram dominadas pelas greves dos operários e movimentos estudantis, organizações essas lideradas por membros de esquerda. Neste clima, iniciou-se a controvertida batalha entre o Estado e manifestantes que reivindicavam o fim do regime. Como consequência, as liberdades individuais foram suprimidas e o país definitivamente entrou em um processo de radicalização entre os militares e a oposição, que gerou o gradual fechamento do regime, até culminar com a promulgação do Ato Institucional n.º 5 (AI-5). O prazo de vigência do AI-5, diferentemente dos atos institucionais anteriores, era indeterminado. O ato dava ao presidente, entre outras prerrogativas extraordinárias, o poder de cassar mandatos de políticos, de fechar o Congresso, suspender o instituto do habeas corpus, impor censura prévia à imprensa, às artes e espetáculos, aposentar compulsoriamente professores universitários e prender dissidentes, enfim tudo o que fosse necessário para apagar qualquer vestígio de oposição ao governo. Como definiria a crônica política, o AI-5 foi o golpe dentro do golpe — o início dos chamados Anos de Chumbo.
No dia 28 de agosto de 1969, o presidente Costa e Silva é acometido por trombose grave. Devido à doença, no dia 31 de agosto de 1969 uma junta militar substituiu o Presidente da República e se confirmou no poder, para evitar que o Vice-Presidente Pedro Aleixo assumisse, pois esse se opusera à implantação do AI-5, sendo o único voto contrário, na reunião do Conselho de Segurança Nacional que decidiu pela promulgação do AI-5.
A Junta Militar era composta pelos ministros do Exército (Aurélio de Lira Tavares), Força Aérea (Márcio de Sousa e Melo) e Marinha (Augusto Hamann Rademaker Grünewald). No dia 1 de setembro de 1969, o AI-12, foi baixado informando à nação brasileira o afastamento do presidente e o controle do governo do Brasil pelos ministros militares.
GOVERNO EMÍLIO MÉDICI (1969-1974)
No dia 30 de outubro de 1969, o general Emílio Garrastazu Médici assumiu a Presidência da República, sendo o terceiro general a ocupar o cargo; inicialmente consolidou a comunidade de informações, interligando todos os escritórios ligados ao SNI. Segundo a imprensa, o combate às esquerdas se intensificou com o início da guerra suja. A repressão aos movimentos de esquerda se intensificou, todos os aparelhos de estado estavam interligados e funcionando a plena potência, os sistemas de vigilância também estavam coordenados e liderados por profissionais treinados nos Estados Unidos.
Logo no início do governo começou a propagação da propaganda institucional visando à elevação do moral da população. Slôganes eram fartamente distribuídos e divulgados a todo instante em todos os meios de comunicação. Músicas de apelo cívico eram divulgadas diariamente; a que mais se fixou no inconsciente coletivo foi a música intitulada Este é um país que vai pra frente. Frases de efeito também eram divulgadas e decalques distribuídos em todas as escolas infantis. Ao mesmo tempo se iniciou uma campanha de aprisionamento, tortura e morte institucionalizada nos porões da ditadura, onde pessoas eram torturadas e mortas pela repressão, ao mesmo tempo em que se intensificaram os atentados e os sequestros praticados pelas guerrilhas.
Entre alguns programas de desenvolvimento social que surgiram neste governo, estão: Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste - PROTERRA (1971); Programa Especial para o Vale do São Francisco - PROVALE (1972); Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia - POLAMAZÔNIA (1974); Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste - POLONORDESTE (1974).
Em síntese, nesse período, não obstante um considerável aumento do produto interno, não se assinala, na economia brasileira, nenhum ganho de autonomia na capacidade de auto-transformação, nem tampouco qualquer reforço da aptidão da sociedade para auto-financiar o desenvolvimento.—
O Ministro da Fazenda de Médici, Delfim Neto, justificava a distribuição de renda: "Não se pode colocar a distribuição de renda na frente da produção. Se o fizermos, acabaremos distribuindo o que não existe". Delfim Neto defendia com esta frase a necessidade de investimento prévio em infraestrutura como as usinas hidrelétricas sem as quais não haveria aumento da produção nacional. O grande beneficiado do "milagre" foi o capital estrangeiro e as empresas estatais que se expandiram muito durante o regime militar, especialmente a Petrobrás, a Vale do Rio Doce e a Telebrás. Sufocada a economia nacional privada, pequenas e médias empresas, perdiam espaço e o endividamento externo crescia. Os trabalhadores, por sua vez, tinham seus salários aviltados, porém estando a inflação baixa até à crise do petróleo de 1973. O maior crítico desse período foi o empresário Kurt Rudolf Mirror que escreveu o livro "A ditadura dos cartéis", que chegou a ser censurado.
O "milagre econômico" (1968-1973) era justificado pelo crescimento do produto interno bruto (PIB) e, entre outros aspectos sociais e econômicos, pelo surgimento de uma nova classe média. Médici utilizou a propaganda institucional maciça para promover o regime. Estabeleceu o senador Filinto Müller, conhecido internacionalmente como "O carrasco que servia a Getúlio Vargas", como presidente do Congresso Nacional e como chefe do partido situacionista, a ARENA. A principal realização do governo Médici foi terminar com os movimentos guerrilheiros e subversivos existentes no Brasil, combate este que ficou a cargo do ministro do exército Orlando Geisel. A maior guerrilha brasileira, a Guerrilha do Araguaia, foi finalmente derrotada, abrindo espaço para que o sucessor de Médici, Ernesto Geisel, iniciasse a abertura política.
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